"Cangaço
e o Carcará Sanguinolento e Outras Contações de Histórias".
Se Junior Dalberto fosse um médico, tenho plena convicção
que ao passar uma receita para um paciente, esse iria passar horas lendo-a, não
porque as letras ali fossem difíceis de serem compreendidas, mas porque ele de
forma magistral, certamente teria descrito cada elemento químico que compõe o
medicamento, ao ponto de o paciente ficar vidrado na descrição e se deleitar
com a história incrível que a receita está lhe proporcionando.
Dalberto tem uma considerável produção literária, das
quais destaco Reféns nos Andes (Baseado
em fatos reais), Blattdea, Teatro Magico
e Pipa Voada Sobre Brancas Dunas. Esse último livro operou em mim uma
revolução no que se refere a experiência no prazer de ler. Entretanto, nesse
texto, evidenciarei a obra Cangaço o
Carcará Sanguinolento e Outras Contações de Histórias, tecendo minha
impressão do mesmo, mas já avisando, apenas do conto que dá nome ao livro.
A obra Cangaço e o
Carcará Sanguinolento e Outras Contações de Histórias" que tenho em
mãos, é uma segunda edição revisada, atualizada e lançada em 2017, pela Editora
CJA. Em pouco tempo de lançado, o livro
já faz sucesso, sendo indicado pela escola CDF para ser trabalhando com seus
alunos em sala de aula e faz parte de um projeto do Sindicato dos Policiais
Federais, nas escolas públicas potiguares.
Os contos que
estão na obra são: Cangaço e o Carcará
Sanguinolento, A Sopa da Discórdia, Nefertiti, A gata Egípcia, A Barca de
Caronte, O Tango no Espelho, Bordeline, O velório da Marquesa DI Fátimo e O
Elevador. Em cada conto Dalberto demonstra toda sua habilidade em contar
história e em deixar-nos cativados, loucos para lermos até o fim cada conto e
saber como será o desfecho das narrativas.
No conto Nefelitite, a gata egípcia, fiquei abismando
como é que alguém consegue escrever que uma pessoa recebeu de outra uma gata de
presente, algo aparentemente tão banal, mas Júnior pega esse fato e faz dele
uma história com todos os elementos que uma história excelente tem que conter.
Êpa! Falei desse conto assim superficialmente, só para deixar vocês loucos para
ler, mas o objetivo aqui é só o conto "Cangaço e o Carcará
Sanguinolento" apesar que o livro em si é de excelência.
Não posso precisar se Júnior Dalberto já leu "O Herói
de Mil Faces", de Joseph Campbeel, mas posso jurar de pés juntos, que o
menino Cangaço, apelido do personagem do conto, cumpre perfeitamente a saga do herói
colocada pelo Campbell ao analisar como se compõe o mito em algumas culturas,
que é mais ou menos assim: O herói recebe um chamado no qual é encarregado para
uma determinada missão, caso aceite esse chamado, parte para uma jornada e ao
retornar, numa apoteose, já não é mais um ser igual aos demais e sim algo
revestido de uma áurea especial (grifo meu), já que Joseph Campbeel faz uma análise
mais detalhada, aqui eu apenas demonstro em partes, para auxiliar em minha
argumentação.
No conto, um Carcará, ave de rapina comum nos céus do
sertão nordestino, causa muito prejuízo para as pessoas que vivem na pequena
vila de pescadores ao redor do Açude Gargalheiras, pois os filhotes dos animais
que essas pessoas criam, como patos e galinhas, que servem para ajudar na renda
ou mesmo para melhorar a mistura de suas refeições, acabam nas garras e no bico
da ave que os devora sem dó, nem piedade, o que faz do pássaro um ser
indesejado pelas pessoas da região e o menino se vê na obrigação de dar um fim
aos dias do carcará, ou seja, essa passa a ser sua missão, sendo o desfecho a execução
de tal feito, a apoteose que transformara o menino em homem e o homem, por sua
vez, em herói. Dar fim aos dias do carcará comedor de pintos e patinhos
indefesos é o chamado de Cangaço, que por esse foi aceito e agora vamos a
jornada, até a redenção, ou seja, se ele irá ou não concluir sua tarefa (missão).
Junior Dalbeto, como bom conhecer da fórmula que constrói
um herói, irá dar a esse um guia, um professor, um instrutor, um ser que irá
guiar (ensinar) ao menino os ardilosos que se deve conhecer na arte de matar
uma ave como o carcará sanguinolento. Daí, em uma outra parte do conto, estão
as ações que irão trazer para morar nas serras que circundam o Gargalheiras, um
velho índio, profundo conhecedor das técnicas de caça, que serão ensinadas ao
Cangaço, para que sua jornada tenha êxito.
Num lugar remoto e longe do açude Gargalheiras, um índio
que perdeu toda sua família no mar, revoltado com esse destino, abandona sua
tribo montado em cavalo e depois de cavalgar por muitos dias, acaba de uma
forma mágica parando no Gargalheiras. Ele conhece o menino Cangaço e os dois
ficaram muito amigos e dessa amizade, o índio ensina para o menino todos os segredos
que havia aprendido na sua tribo, desde criança, sobre a arte de caçar. Quando
curumim, ele mesmo havia caçado um jacaré e tal feito lhe rendera muito
respeito por parte de seu pai e dos outros membros da sua tribo. Conta para
Cangaço, que quando um caçador mata um animal, deve comer o coração desse ainda
cru, pois assim adquirirá poderes especiais para novas caçadas. No conto, vocês
irão ler como isso é descrito em detalhe.
Uma amiga minha, a
Gabriela Silva, diz algo em um poema dela que bem descreve o que é um escritor.
Lanço mão desse poema aqui para descrever Junior Dalberto:
Ser escritor é
Olhar pra dor e
sorrir
Porque sabe que
Usando as palavras
certas,
A dor se torna
bela.
A saudade cria
rimas,
As lágrimas viram
estrelinhas,
A ansiedade fica
bonita e
Toda a dor vira
Poesia.
Júnior Dalberto é tudo isso que a Gabriela escreve e até
um pouco mais. São muitos detalhes, muitas coisas que sua genialidade coloca no
texto que vai fazendo com que as coisas se revistam de novo sentido e nos
emocionem em cada novo paragrafo escrito por ele.
Percebo que qualquer um de nós adoraríamos ser o menino
Cangaço, andar por aí com uma baladeira, usando sempre as mesmas roupas que de
tão usada, já se confundem com a própria pele. Quem não amaria ser livre para
tomar banho na rua sem preocupação com o tempo? Quem não gostaria de se
embrenhar nas matas, dentro da caatinga e conhecer as belezas das serras e seus
muito encantamentos? Quem não quer ter um amigo confidente que lhe ensine sobre
os segredos da vida?
O enredo desse
conto tem muitos elementos, tem coisas boas e ruins que acontecem com nosso
protagonista, que hora e outra leva umas porradas do pai, que o disciplina. Tem
a mãe do menino com seus afazeres e preocupações e uma amiga com quem divide
confidencias. Vocês irão conhecer as falas dessas pessoas, as vidas dessas
pessoas e darão suas próprias opiniões, assim que lerem esse magnifico livro de
Júnior Dalberto. Eu apenas vaguei por alguns momentos do menino, não entrei na
sua profundidade, mas em alguns de seus momentos crucias, seu aprendizado para
matar o pássaro que muito não acreditam que ele conseguirá.
Meus estimados leitores, quando lerem "Cangaço e o
Carcará Sanguinolento e Outras Contações de Histórias", por favor me
avisem se a saga do herói foi concluída? Como nos permite sermos livres esse
Junior Dalberto? Dalberto é ou não majestoso na utilização das palavras? O herói
até passa por muitas fases, até se transformar em herói, mas aí vão lá e
descubram como.
Boa Leitura!!!
Claudio Wagner
Poeta, professor historiador, Cientista das Religiões, 1º Secretário da
SPVA/RN e autor do livro Entre a Sombra
da Razão e a Razão da Sombra.
Referências:
CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. São Paulo: Cultrix,1997.
DALBERTO, Júnior. "Cangaço e o Carcará Sanguinolento e Outras
Contações de Histórias". CJA-EDITORA, Natal-RN, 2017.
SILVA, Gabriela. Texto que me foi enviado por e-mail. Natal-RN, 06 de
junho de 2018.
Parabéns carissimo Claudio e a SPVA/RN pelo valioso esforço em despertar o hábito da leitura.
ResponderExcluirSou potiguar como Dalberto e, como tal, não pude deixar de me ver entranhado nas artimanhas de Cangaço, na sua saga para matar o carcará sanguiolento. Revivi muitas das minhas aventuras, voltando ao tempo de criança, pelas terras de Brejinho/RN, minha terra natal. Além do conto que intitula a obra, muito fui surpreendido por outras contações que compõem o livro, sobretudo "Boderline" e "A Barca de Caronte (que me inspirou a escrever o conto "Caronte - Sem troco para travessia", que consta no meu primeiro livro de contos, cujo título é uma das suas histórias, chamada "Sob o Farfalhar do Juazeiro"), ainda não publicado. Junior Dalberto é, sem dúvida, um autor de muitas faces, uma referência...
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