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quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Resenha Poética com Cláudio Wagner


O Ser Negro na Cidade do Natal- RN: Um olhar de quem vive essa realidade.

Negro drama, e sei quem trama, e quem tá comigo, o trauma que eu carrego, pra não ser mais um preto fodido.” (Racionais Mc's)

O ano é da graça do nosso senhor de 2017, século XXI, Natal-RN, Brasil. Tenho a pele escura, ou seja, sou negro de nascimento e de vida. Para quem vai começar a ler esse texto certamente deve estar se perguntando: e o que a cor da pele do escritor tem a ver com o texto? E o que você leitor têm a ver com as questões relacionadas a ser negro na Cidade do Natal? E digo: tens muita coisa a ver. Fazem mais de 100 anos desde que o Brasil, que na época tinha apenas 15 milhões de habitantes e não os mais de 200 milhões que temos hoje, aboliu a escravidão negra, onde aliás os negros que foram libertos somavam 700 mil, isso lá para os 13 de maio de 1888, não era um número considerado expressivo, devido antes a outras políticas que já vinham sendo implementadas buscando o fim dessa parte por demais vergonhosa do nosso passado, a escravidão de homens e mulheres que eram forçados a trabalhar de graça – e isso era justificado, tão somente porque devido a sua cor de pele – esses não eram considerados gente (seres humanos) Seja pela igreja católica que chegou a afirmar que esses não tinham alma, seja pelas teorias do Evolucionismo e Racionalismo que ganham forma na sociedade europeia nos séculos XVIII e XIX.
Mas, o estranho é perceber que mesmo passado tanto tempo desde a liberdade da escravidão negra no Brasil, e no caso específico em Natal a situação dos Negros(as) mesmo que libertos, continua sendo muito difícil, pois o “racismo” ideia que defende a superioridade de uma raça sobre a outra – brancos superiores a negros – de acordo com essa ideia e que ainda hoje age às escondidas, sempre de forma camuflada, impera entre nós e é a responsável direta para que a vida de quem tem a pele escura seja levada nas condições mais degradantes da existência humana, em comparação a outros grupos étnicos-culturais. E é bom lhe deixar ciente que o racismo não é algo que sempre existiu ou mesmo que nasce entre nós, mas que ele é fruto de um processo histórico têm raízes lá nos séculos XVIII e XIX, momento de expansão comercial europeia, principalmente Inglaterra, Espanha e Portugal que viam tanto no "Evolucionismo" como no "Racionalismo" as teorias que davam base e sustentação para que os europeus dominassem as suas colônias, e os povos que nelas habitavam. Exemplos: Brasil colônia de Portugal e África colônia Inglesa de onde foi retirada à força a maioria da mão de obra escrava levada para trabalhar nas suas colônias.
O evolucionismo, teoria desenvolvida por Charles Darwin defende que todas as espécies que existem no planeta são fruto de bilhões de anos de evolução e que todas foram evoluindo a partir de organismos mais simples que vão se especializando e os mais fortes conseguem sobreviver formando novas e mais complexas espécies. Usando essa teoria o branco europeu justificou que seu domínio sobre negro africano era porque o segundo fazia parte de uma espécie inferior que ainda estava num estágio quase que animal e precisava então evoluir e caberia aos brancos esse papel de levá-los para essa suposta evolução.
Já o racionalismo, corrente filosófica que tem uma origem aproximada lá pelo século I antes da era comum, e porém, não exatamente das suas ideias fundantes que trato aqui, mas sim das que iriam se desenvolver e florescer junto com o pensamento liberal no séculos XVIII e XIX com a partir de pensadores como Descartes, Spinosa e Leibniz. Descartes conhecido por ser o fundador do "método científico", defende uma supremacia da ciências em relação por exemplo, a religião, e que só a partir de um método de estudo apurado é que se pode chegar as verdades relativas a vida. Pensadores como George Wilhelm e Friedrich Hegel vão demonstrar em sua obra como os brancos são superiores em relação as artes, a filosofia, a ciência, política e etc. Cabendo inclusive a esses guiar os negros para fora do seus atrasos civilizatórios. Nas palavras de Hegel:

O negro, como já observamos, exibe o homem natural em seu estado mais completamente selvagem e desregrado. Devemos deixar de lado qualquer pensamento de reverência e moralidade –tudo o que podemos chamar de sentimento – se quisermos compreendê-lo corretamente; não há nada em consonância com a humanidade que possa ser encontrado neste tipo de caráter.

A citação por si só já diz tudo, mostra o quanto esse pensamento é um fulcro para as teorias racistas o que talvez muito nem saibam, pois jamais tendo lido Hegel ou mesmo algum outro autor aqui referido. Certamente essa frase proferida hoje em dia que temos movimentos organizados contra discriminação e preconceito o autor seria processado e até nem a teria escrito. Mas século depois, ela a frase, é ainda atual para o grupos que vivem da disseminação do ódio racial mesmo sendo esses ignorantes a respeito do contexto histórico e cultural onde esse ódio foi criado.
Porém, estamos na Natal-RN século XXI e o olhar que apresentamos aqui sobre a situação de SER NEGRO nessa cidade do Sol, e de Brancos são os números dos órgãos oficias como o IBGE que falam por si, que gritam sobre como a situação dos Negros(as) é vivida na mais pura desigualdade de oportunidades referente a moradia, educação, acesso a saúde, condições de trabalho e ascensão social. Segundo a Estatística (IBGE) e Mapa da Violência de 2016:

39.471 pessoas que residem em Natal se declaram negras (IBGE) e Mapa da Violência de 2016. 11.399 natalenses negros vivem entre meio a um salário mínimo. Apenas 219 residentes em Natal que são negros vivem com mais de 10 salários mínimos, 16.983 negros não possuem o ensino fundamental completo ou são analfabetos. Somente 2.387 pessoas terminaram uma faculdade. 39.354 negros que residem em Natal moram em casa, sendo que 6.110 moram em barracos nas favelas

Se somarmos esse números a questão da violência sofrida pela população negra percebermos que não é fácil para alguém de cor viver nessa cidade segundo matéria do jornal Tribuna do Norte de 30/12/2015 com o titulo: No RN, 82,7% das Vítimas de homicídios são negros ou pardos. O que desmontaria a marca da desigualdade racial no tocante as mortes violentas em nossa estado. A mesma matéria trabalha os números de mortes por cada cidade no estado e Natal aparece em 1 colocada com 499 homicídios. Dentro desse número a maioria é parda ou negra. A matéria relata que oito em cada das pessoas que foram mortas no ano de 2015 são negras ou pardas. Esse número aumentou em relação a 2014, mas mesmo nesse outro ano o número de mortos de brancos foi inferior ou de negros.
Como o próprio titulo do texto sugere, somos negros, vivemos e sabemos a realidade e como a questão aqui é um olhar usamos alguns dados e buscamos fazer elos com a história das questões raciais para quem sabe, juntos, possamos buscar os caminhos para acabar com essas desigualdades que separam historicamente brancos e negros, no que se refere a ter acesso a educação, saúde, moradia, segurança, emprego, ou seja, as questões mínimas para a garantia de uma vida como um cidadão completo. Lembrando que quem olha, olha para algum lugar e vê alguma direção, e olhando deixo as perguntas: por quê na Câmara de Vereadores(as) de Natal não temos na atual legislatura nenhum negro? Por que o Dia da Consciência Negra (20 de novembro) onde lembramos Zumbi dos Palmares foi retirado do calendário como feriado? Mas, os feriados santos continuam. As respostas a essa perguntas parecem sim que estão ligadas ao preconceito de raça, aliás essa ideia de raça já foi a muito abolida pela ciências, pois somos uma única espécie humana, mas essa ideia de raça ainda persiste na cabeça do irracionais.
E na música Negro Drama os “Negro Drama” (Racionais MC) dizem assim: “Eu sei quem trama, e quem tá comigo, o trauma que eu carrego, pra não ser mais um preto fodido.” Só sabendo (conhecendo) nossa história e raízes do preconceito e entendendo que está ao nossa lato nessa luta para superar as desigualdades é que iremos mudar as estatísticas para negros, pardos.


Referencia

http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/no-rn-82-7-das-va-timas-de-homica-dio-sa-o-negros-ou-pardos/334363

http://www.mapadaviolencia.org.br/

Figueiredo, Fábio Baqueiro. História da África, Brasília: Ministério da Educação. Secretária de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade.

Salvador: Centro de Estudos Afro Orientais, 2009.

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