O
Ser Negro na Cidade do Natal- RN: Um olhar de quem vive essa
realidade.
“Negro
drama, e sei quem trama, e quem tá comigo, o trauma que eu carrego,
pra não ser mais um preto fodido.”
(Racionais Mc's)
O
ano é da graça do nosso senhor de 2017, século XXI, Natal-RN,
Brasil. Tenho a pele escura, ou seja, sou negro de nascimento e de
vida. Para quem vai começar a ler esse texto certamente deve estar
se perguntando: e
o que a cor da pele do escritor tem a ver com o texto?
E o que você leitor têm a ver com as questões relacionadas a ser
negro na Cidade do Natal? E digo: tens muita coisa a ver. Fazem mais
de 100 anos desde que o Brasil, que na época tinha apenas 15 milhões
de habitantes e não os mais de 200 milhões que temos hoje, aboliu a
escravidão negra, onde aliás os negros que foram libertos somavam
700 mil, isso lá para os 13 de maio de 1888, não era um número
considerado expressivo, devido antes a outras políticas que já
vinham sendo implementadas buscando o fim dessa parte por demais
vergonhosa do nosso passado, a escravidão de homens e mulheres que
eram forçados a trabalhar de graça – e isso era justificado, tão
somente porque devido a sua cor de pele – esses não eram
considerados gente (seres humanos) Seja pela igreja católica que
chegou a afirmar que esses não tinham alma, seja pelas teorias do
Evolucionismo e Racionalismo que ganham forma na sociedade europeia
nos séculos XVIII e XIX.
Mas,
o estranho é perceber que mesmo passado tanto tempo desde a
liberdade da escravidão negra no Brasil, e no caso específico em
Natal a situação dos Negros(as) mesmo que libertos, continua sendo
muito difícil, pois o “racismo” ideia que defende a
superioridade de uma raça sobre a outra – brancos superiores a
negros – de acordo com essa ideia e que ainda hoje age às
escondidas, sempre de forma camuflada, impera entre nós e é a
responsável direta para que a vida de quem tem a pele escura seja
levada nas condições mais degradantes da existência humana, em
comparação a outros grupos étnicos-culturais. E é bom lhe deixar
ciente que o racismo não é algo que sempre existiu ou mesmo que
nasce entre nós, mas que ele é fruto de um processo histórico têm
raízes lá nos séculos XVIII e XIX, momento de expansão comercial
europeia, principalmente Inglaterra, Espanha e Portugal que viam
tanto no "Evolucionismo" como no "Racionalismo"
as teorias que davam base e sustentação para que os europeus
dominassem as suas colônias, e os povos que nelas habitavam.
Exemplos: Brasil colônia de Portugal e África colônia Inglesa de
onde foi retirada à força a maioria da mão de obra escrava levada
para trabalhar nas suas colônias.
O
evolucionismo, teoria desenvolvida por Charles Darwin defende que
todas as espécies que existem no planeta são fruto de bilhões de
anos de evolução e que todas foram evoluindo a partir de organismos
mais simples que vão se especializando e os mais fortes conseguem
sobreviver formando novas e mais complexas espécies. Usando essa
teoria o branco europeu justificou que seu domínio sobre negro
africano era porque o segundo fazia parte de uma espécie inferior
que ainda estava num estágio quase que animal e precisava então
evoluir e caberia aos brancos esse papel de levá-los para essa
suposta evolução.
Já
o racionalismo, corrente filosófica que tem uma origem aproximada lá
pelo século I antes da era comum, e porém, não exatamente das suas
ideias fundantes que trato aqui, mas sim das que iriam se desenvolver
e florescer junto com o pensamento liberal no séculos XVIII e XIX
com a partir de pensadores como Descartes, Spinosa e Leibniz.
Descartes conhecido por ser o fundador do "método científico",
defende uma supremacia da ciências em relação por exemplo, a
religião, e que só a partir de um método de estudo apurado é que
se pode chegar as verdades relativas a vida. Pensadores como George
Wilhelm e Friedrich Hegel vão demonstrar em sua obra como os brancos
são superiores em relação as artes, a filosofia, a ciência,
política e etc. Cabendo inclusive a esses guiar os negros para fora
do seus atrasos civilizatórios. Nas palavras de Hegel:
O
negro, como já observamos, exibe o homem natural em seu
estado
mais completamente selvagem e desregrado. Devemos
deixar
de lado qualquer pensamento de reverência e moralidade –tudo o que
podemos chamar de sentimento – se quisermos compreendê-lo
corretamente; não há nada em consonância com a
humanidade
que possa ser encontrado neste tipo de caráter.
A
citação por si só já diz tudo, mostra o quanto esse pensamento é
um fulcro para as teorias racistas o que talvez muito nem saibam,
pois jamais tendo lido Hegel ou mesmo algum outro autor aqui
referido. Certamente essa frase proferida hoje em dia que temos
movimentos organizados contra discriminação e preconceito o autor
seria processado e até nem a teria escrito. Mas século depois, ela
a frase, é ainda atual para o grupos que vivem da disseminação do
ódio racial mesmo sendo esses ignorantes a respeito do contexto
histórico e cultural onde esse ódio foi criado.
Porém,
estamos na Natal-RN século XXI e o olhar que apresentamos aqui sobre
a situação de SER NEGRO nessa cidade do Sol, e de Brancos são os
números dos órgãos oficias como o IBGE que falam por si, que
gritam sobre como a situação dos Negros(as) é vivida na mais pura
desigualdade de oportunidades referente a moradia, educação, acesso
a saúde, condições de trabalho e ascensão social. Segundo a
Estatística (IBGE) e Mapa da Violência de 2016:
39.471
pessoas que residem em Natal se declaram negras (IBGE) e Mapa da
Violência de 2016. 11.399 natalenses negros vivem entre meio a um
salário mínimo. Apenas 219 residentes em Natal que são negros
vivem com mais de 10 salários mínimos, 16.983 negros não possuem o
ensino fundamental completo ou são analfabetos. Somente 2.387
pessoas terminaram uma faculdade. 39.354 negros que residem em Natal
moram em casa, sendo que 6.110 moram em barracos nas favelas
Se
somarmos esse números a questão da violência sofrida pela
população negra percebermos que não é fácil para alguém de cor
viver nessa cidade segundo matéria do jornal Tribuna do Norte de
30/12/2015 com o titulo: No RN, 82,7% das Vítimas de homicídios são
negros ou pardos. O que desmontaria a marca da desigualdade racial no
tocante as mortes violentas em nossa estado. A mesma matéria
trabalha os números de mortes por cada cidade no estado e Natal
aparece em 1 colocada com 499 homicídios. Dentro desse número a
maioria é parda ou negra. A matéria relata que oito em cada das
pessoas que foram mortas no ano de 2015 são negras ou pardas. Esse
número aumentou em relação a 2014, mas mesmo nesse outro ano o
número de mortos de brancos foi inferior ou de negros.
Como
o próprio titulo do texto sugere, somos negros, vivemos e sabemos a
realidade e como a questão aqui é um olhar usamos alguns dados e
buscamos fazer elos com a história das questões raciais para quem
sabe, juntos, possamos buscar os caminhos para acabar com essas
desigualdades que separam historicamente brancos e negros, no que se
refere a ter acesso a educação, saúde, moradia, segurança,
emprego, ou seja, as questões mínimas para a garantia de uma vida
como um cidadão completo. Lembrando que quem olha, olha para algum
lugar e vê alguma direção, e olhando deixo as perguntas: por quê
na Câmara de Vereadores(as) de Natal não temos na atual legislatura
nenhum negro? Por que o Dia da Consciência Negra (20 de novembro)
onde lembramos Zumbi dos Palmares foi retirado do calendário como
feriado? Mas, os feriados santos continuam. As respostas a essa
perguntas parecem sim que estão ligadas ao preconceito de raça,
aliás essa ideia de raça já foi a muito abolida pela ciências,
pois somos uma única espécie humana, mas essa ideia de raça ainda
persiste na cabeça do irracionais.
E
na música Negro Drama os “Negro Drama” (Racionais MC) dizem
assim:
“Eu sei quem trama, e quem tá comigo, o trauma que eu carrego, pra
não ser mais um preto fodido.”
Só sabendo (conhecendo) nossa história e raízes do preconceito e
entendendo que está ao nossa lato nessa luta para superar as
desigualdades é que iremos mudar as estatísticas para negros,
pardos.
Referencia
http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/no-rn-82-7-das-va-timas-de-homica-dio-sa-o-negros-ou-pardos/334363
http://www.mapadaviolencia.org.br/
Figueiredo,
Fábio Baqueiro. História da África, Brasília: Ministério da
Educação. Secretária de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade.
Salvador:
Centro de Estudos Afro Orientais, 2009.
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