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Brinquedoteca Itinerante e Popular

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Resenha Poética com Cláudio Wagner: RUA DESCALÇA...


RUA DESCALÇA...

           Quando adentrei pelas portas da percepção dei de cara com a Esfinge que me interpelou: DECIFRA-ME OU DEVORO-TE! De pronto respondi: Teu segredo é poesia! Pura, simples e bela poesia. E o ser mitológico sumiu de minha frente e dei de cara com esse belo livro que aqui lhes rabisco algo a respeito. Já no fragmento que escolhi para nossa degustação, fica por demais explicito que é a poesia o lugar de sermos decifrados, venham comigo e tirem suas próprias conclusões:


Quem Sou?!...
A tarde envolta em dourado
esvai-me languidamente no horizonte
escapulindo lentamente da clareza abundante
que esculpi os contornos precisos
das formas que enchem a vida!
(p.32)

           Ora, não somos nós esse emaranhado de certezas e de dúvidas? Não somos a composição de tardes, que vão se exaurindo, mas que em outros dias voltam a se refazer, e somos certezas e dúvidas? Quem Sou?! Pergunta a Poetisa.
            E, em Rua descalça, vamos encontrar uma rua bem nossa, pois quem não a tem em sua vida, quem não reconhece, uma pelo menos, por onde o progresso não a pavimentou, onde os paralelepípedos ainda não esconderam embaixo de si a areia? Pode ser a Rua descalça, símbolo de um povo descalço, sem chinelos, sem tênis, sem os sapatos que protejam os pés. Também sem direitos, sem moradia digna, sem pão e sem amor. E é claro, e não menos importante, a Rua descalça, como lembranças da infância de brincadeiras mil, onde corre tendo contato com a areia e si religa ao divinal da natureza nua e crua.
           Só a poesia dá margem para essas interpretações, só a poesia resignifica os absurdos, colocando esses em perfeita ordem. Só ela mesma dá ao caos palavras organizadas, um cosmo lugar onde nossos sonhos podem fincar moradia. Jania Souza trabalha essa poesia com precisão milimétrica.
Na marcha batida das interrogações e das certezas, a poesia segue a nos devolver e tirar mundos. Na página 53, da caminhada leitura que estamos a fazer em Rua descalça, temos a pergunta resposta: "Onde está o amor?!" Leia você e me diga:

Pergunto: - Onde está o amor?!....
Lá! ... Embaixo daquela ponte
Enrodilhado bem no escuro,
tentando entrever uma flor?!…

           Sou capaz de ouvir as palavras de baixo calão que você certamente profere agora contra minha pessoa, ao mesmo tempo em que falas: Cadê o restante do poema? Por quê esse embusteiro não o colocou na íntegra para que possamos ver qual o sentido, qual lugar onde estará o amor, já que a poetisa parece apontar, quando afirma: “Lá!”. Porém, me desculpe, o convite aqui é para que você arregace as mangas, saia de sua zona de conforto e vá a procura desse livro, que saia na captura das obras dos autores potiguares. E com o livro de Jania Souza, obvio que não seria diferente. Apenas descortino um pouco da obra, o restante amigo, é com você.
           Modifico a pergunta da Esfinge por uma afirmação, aliás, intimação: Decifre as belíssimas poesias que estão nas páginas (mundos) de Rua descalça... ou viva pagando o preço eterno de passar por essa vida e nunca ter experimentado algo tão singelamente efêmero-e-eterno na mesma intensidade.


Claudio Wagner
Poeta, professor historiador, Cientista das Religiões, 1º Secretário da SPVA/RN e autor do livro Entre a Sombra da Razão e a Razão da Sombra.

REFERÊNCIA
SOUZA, Jania. Rua descalça...Recife-PE, Edições Bagaço, 2017.

Um comentário:

  1. Amei, Cláudio Wagner! Minha gratidão. Gosto da forma como você articula a sua argumentação. A esfinge foi o grande chamariz para a atenção do leitor sobre o conteúdo. Já li outros trabalhos seus e venho encantando-me a cada nova edição. Meu aplauso.

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